
Por Juliana Vannucchi
Conversei com a artista visual Tuca Galvan, que dá vida a universos artísticos inspiradores, profundos e repletos de criatividade.
Dentre seus numerosos feitos, destaca-se seu projeto de arte postal, através do qual, desde 2020, Tuca entrega cartões postais para pessoas desconhecidas, em endereços aleatórios.
Há poucos meses atrás, Galvan, numa iniciativa absolutamente original e belíssima, começou a enviar cartões acompanhados de poemas haikais, focados num tema específico: a saudade, sentimento que, segundo Tuca, “é universal e atravessa as pessoas em qualquer país em que estejam”.
Nessa conversa reflexiva que tivemos, a artista visual contou um pouco sobre esse projeto, e muito outros assuntos também foram tratados.
Tuca, falou, por exemplo, sobre seu apreço pelo experimento de materialidades do descarte de recicláveis e seu gosto por pesquisas estéticas deste universo, além de falar também sobre as exigências e esforços que um artista precisa ter para se manter ativo, e muitos outros assuntos que foram abordados.

1 – Tuca, primeiramente gostaria de entender quando a arte passou a fazer parte da sua vida. Em que momento você começou a se reconhecer como artista?
Muito surgiu a partir do que eu vi meus pais fazerem, e eles me ensinaram porque eu realmente gostava de aprender.
Meu pai, por exemplo, tocava violão e produzia peças lindas em madeira e minha mãe, era artesã e trabalhava com uma diversidade de materiais.
Por ter essas influências em casa, frequentei escolas de desenho, pintura, cerâmica, música, dança…
Depois de 30 anos como empreendedora na área de saúde e educação, resolvi parar de tangenciar a arte, e disse sim, para o meu eu artista.
E já na maturidade, resolvi fazer cursos de fotografia, de artes visuais, participei de alguns grupos de estudo, mentorias com curadores e artistas e fiz residência artística.
Assim, desde 2018, estou me dedicando a estudar, produzir e querer entender a arte, e um pouco do sistema…
Ainda há muito caminho para trilhar, porém, vejo que já começo a deixar tudo isso seguir naturalmente, sem tantas amarras…
2 – O que é arte para você?
Parafraseando Lewis Carroll, a arte é uma oportunidade para imaginar o possível e as vezes o que parece impossível, ela é cheia de incertezas. Talvez um desejo do criar, do fazer e pensar a partir de algo que não existe.
É criar o que eu nem sei direito como será ou sequer terá uma função.
Daí a coragem em continuar fazendo, por meio de uma poética, num desejo de realizar e criar condizentes ao meu próprio repertório de vida e, felizmente, com algumas contradições que me colocam dentro de uma normalidade de ser e existir.
Acho que… Permita-me um parêntese, agora me dei conta de que nunca gostei muito de respostas com “acho que”, entretanto, talvez tenha sido um aprendizado na arte: lidar melhor com as incertezas.
Eu tenho uma inquietude que me conduz à uma necessidade de produzir, produzir e produzir, num universo de diversas técnicas de manualidades.
Cada trabalho é único e vem a partir da necessidade da minha própria produção em si.
Não entendo o porquê de algumas coisas, mas quero continuar fazendo.
Me apoio na Clarice Lispector, quando disse: “Não se preocupe em entender. Viver ultrapassa qualquer entendimento.”


3 – Acredita na arte como um processo de cura?
Entendo que sim e que não. Ela pode salvar, mas também angustiar. Por isso não romantizo a arte.
Mas, sim, eu sinto que muitas vezes há sofrimento e uma certa melancolia no fazer artístico.
A arte tem questões muito fortes, além de política e poética. Ela envolve muitas outras atividades e serviços.
Há muitas questões para fazê-la acontecer.
É uma engrenagem de movimentos incessantes de pesquisas, leituras e estudos, exposições, projetos, editais…
A grande maioria de artistas segue no formato Artista S/A, solitário e autogerenciado, sem muito apoio para realizar.
É preciso saber gerenciar o tempo para produzir e trabalho para gerar e/ou captar recursos financeiros, se realmente quiser permanecer nela.
E a arte é bem exigente quando o assunto é produção, precisa de recursos, disciplina, tempo, dedicação… Pessoalmente, digo que vale muito tudo isso.
Eu já li em algum livro que a arte pode não salvar o mundo, mas, em contrapartida, ela salva o minuto.


4 – Para você, qual é o maior obstáculo que um artista pode encontrar na tentativa de se profissionalizar?
Me pergunto se o desejo do artista que se dedica ao fazer artístico é a profissionalização…
Os artistas pesquisam, experimentam e estudam para a produção artística.
E há especialistas nas artes e instituições que exigem uma formação acadêmica. Mas a grande maioria dos artistas que trabalha com arte, não se dedica exclusivamente a produção artística.
Estes têm um acúmulo de função trabalhando em instituições culturais públicas ou privadas, galerias de arte, em setores de pesquisa, em produção cultural, montagem, em ateliês, educativo de museus, espaços de arte, independentes. E muitos que vivem de arte não são artistas.
E pode parecer contraditório, mas mesmo com a precarização da arte e no nosso país, onde menos de 10% da população consome arte, com uma fatia orçamentária governamental crítica, políticas públicas e outros recursos escassos, negociação e comercialização de obras de arte com regras sem muita clareza, enfim, são muitos obstáculos, mas eu ainda desejo conquistar alguns espaços e me manter como artista.
Na minha primeira formação, no mundo corporativo, foram 10 anos para eu concluir uma graduação, duas pós-graduções e outros cursos extensivos.
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Na arte, eu não me vejo conseguindo me inserir, da maneira como eu desejo, antes deste prazo.
E eu não tenho a garantia de conquistar, mas continuo em movimento para realizar, participando de cursos, de exposições, projetos, me inscrevendo em editais, visitando exposições para conhecer novos trabalhos e outros artistas…
5 – Poderia nos contar um pouco sobre as recentes exposições das quais tem participado?
Recentemente encerrei uma participação na exposição Casa Corpo São Paulo (@casa__corpo).
Um grupo só de artistas mulheres, adorei fazer parte, mulheres inteligentes que fizeram deste processo a criação de um espaço para a escuta do feminino.
Um movimento para orientação sobre o corpo da mulher, saúde, doenças, cuidados, literatura feminina, foi um trabalho maravilhoso.
E outras exposições coletivas, com artistas incríveis, sob o título Outras Paisagens, no Museu de Arte Contemporânea, MAC_Niterói e Museu Nacional da República, MUN_DF (@outraspaisagens). Atualmente, estou com uma exposição no Centro Cultural dos Correios_RJ, Correspondências: memórias e identidade.
Nesta atual exposição, estou reativando um projeto no qual eu distribuo cartões postais, com haikais, para pessoas desconhecidas, em endereços aleatórios.
É como um gesto de atenção e empatia com as pessoas, pequenos movimentos de doação ao que reafirma o que é do humano.
E em novembro deste ano participarei da exposição coletiva, Do fio que tece afetos (@fioqueteceafetos), na Pinacoteca de São Caetano do Sul_SP.


6 – Quais são suas principais influências artísticas e fontes de inspiração?
Phillyda Barlow, Louise Nevelson, Fayga Ostrower, Andrey Zignnatto, Rauschenberg, Paulo Brusky, enfim, muitos outros também.
Comumente, a inspiração vem quando estou no meu ateliê, trabalhando e pensando arte. Há muitos estímulos para pôr a mão na massa e produzir.
Herdei este método de trabalho dos anos em que atuei no mundo corporativo: 10% de inspiração e 90% de transpiração.
Eu tenho uma pira em resgatar e experimentar materialidades do descarte de recicláveis e pesquisar a estética deste universo.
Eu cresci vendo os meus pais fazendo reaproveitamento de peças, que seriam desprezadas, numa época em que uma minoria falava sobre este assunto.
E hoje, eu tenho orgulho de saber que isto também está em mim, porque eles me colocaram neste lugar.
Mas é claro que eu faço pausas, mudo de ambientes, sou muito urbana, amo caminhar, observar arquiteturas e a insistência da natureza urbana e seus vestígios de sobrevivência nas metrópoles, me encanta.
As vezes ligo o meu “aspiradorzinho” e saio para ver o frenesi da cidade, observar as pessoas e suas conexões, o modo como se relacionam com o que está no entorno, ouvir histórias… perceber as incertezas da vida.
Mas tem outros fatores que eu prezo, como me organizar e dedicar tempo para ler, ouvir música, ver exposições, espetáculos, filmes, viajar, passear…
A minha inspiração está em viver o presente e manter a vida em movimento.

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