“A Relevância da Mentira como Componente Artístico em Oscar Wilde:” por Juliana Vannucchi

Juliana Vannucchi é graduada em Comunicação Social, licenciada em Filosofia e Editora-chefe do site Fanzine Brasil.
Juliana Vannucchi é graduada em Comunicação Social, licenciada em Filosofia e Editora-chefe do site Fanzine Brasil.
Anúncio

Este texto visa explorar e compartilhar com os leitores, algumas observações e interpretações sobre um ensaio escrito por Oscar Wilde em 1891, intitulado A Decadência da Mentira.

O referido texto trata-se de um diálogo entre Vivian e Cyril, dois personagens que se encontram numa biblioteca, e que passam a refletir sobre a inserção da mentira na obra de arte.

Logo no segundo parágrafo do texto, Wilde, expressa a base de sua reflexão artística quando um dos personagens convida o outro para ir apreciar a natureza, e recebe como resposta, o seguinte comentário: “Quanto mais estudamos a Arte menos nos importamos com a Natureza, pois esta última, em nossas vidas, se mostra cheia de “falta de conclusões”, “crueldades curiosas” e “monotonia” e “caráter absolutamente indefinido”. (WILDE, 1992, p. 25).

Anúncio

Nesta passagem, notamos que o personagem destaca a oposições entre razão e emoção, e busca desvincular a Arte de ligações com a primeira, pois ele acredita que a lógica é dispensável para a percepção artística (tanto na contemplação quanto na produção).

Posteriormente, há um complemento em que se propõe que a Arte surge como “nosso esforço para acomodar a natureza” (Ibid., p. 26).

Ou seja, a Arte não precisa, necessariamente explicar aquilo que está ao seu redor e tampouco possui algum compromisso intelectual específico com essa realidade, a Arte é uma apresentação irracional de sentimentos que podem possuir influência externa ou interna, e não é e tampouco atua de maneira racional.

A conversa entre os personagens segue, e um deles profere a seguinte frase a respeito da atividade do pensamento: “Pensar é o que há de mais doentio no mundo. Disto se morre como de qualquer moléstia” (Ibid., p. 26).

Na sequência da conversa, Wilde, então, introduz a ideia da mentira ao diálogo, apontando-a como um fato cuja ausência desencadeia decadência à literatura da época. Mostra que a poesia (conforme já afirmava Platão) caminha junto com a mentira: ambas são artes e ambas possuem seu conjunto de técnicas.

O personagem afirma que a mentira é necessária para a obra de arte e que, ao invés de prejudicá-la e torná-la banal ou repulsiva, ela a fortalece. Para Platão, a arte era uma ilusão com efeitos negativos, pois esta consistia numa cópia da cópia, ou seja, o artista copiava aquilo que o cercava e que, por si só, representava uma cópia do mundo das Ideias.

“Nada suprimi tanto as qualidades de uma história quanto tentar torná-las demasiado verídicas” (Ibid., p. 30).

Vivian lança críticas a certos escritores, colocando alguns destes como gênios artísticos e outros como produtores de uma arte que se fideliza erroneamente com a realidade externa e material.

Como primeiro exemplo, ele exalta Balzac: “ele criava a vida e não a copiava” (Ibid., p. 36). Em oposição, está Zola cujos personagens excessivamente moralistas não são construídos com qualquer beleza artística. Shakespeare também é acusado de abandonar a imaginação e produzir um material com linguagem natural, diretamente inspirado na vida.

A Arte é compreendida como objeto sensível que é moldado por uma produção resultante de um processo criativo e expressivo de seu produtor, e que cujo produto final irá ser assimilado por um espectador através de seus sentidos.

Dentro deste quadro, exclui-se a noção da lógica ou do engajamento artístico. Qualquer fator que prenda a Arte às circunstâncias externas, e que a prenda a descrições deste ambiente, tornam-na enfraquecida, pois o poder que a Arte possui e a sua singularidade de efeitos na humanidade, reside justamente no fato de que ela não necessita da verdade, nem da linearidade ou da lógica e, tampouco, deve ter como função, simplesmente espelhar a realidade externa.

A Arte não representa mais nada a não ser a si própria. “A Arte começa com a decoração abstrata, com um trabalho puramente imaginativo e agradável, não se aplicando senão ao irreal, ao não existente”. (Ibid., p. 39).

Em certo momento do texto, Vivian afirma que a própria natureza é quem imita a Arte, pois quando nos atentamos ao que está ao nosso redor, nos inserimos numa atividade artística, já que a observação atenta da natureza, isto é, ver o que se dispõe em nosso entorno, é diferente de simplesmente olhar superficialmente, e esse ver atentamente, é uma verdadeira busca pelas mais sutis e simples belezas que estão nos rodeando.

Inscreva-se para receber as Novidades sobre Eventos
e o Universo das Artes primeiro!

Ora, é por intermédio da Arte que aprendemos a perceber aquilo que é belo, e, portanto, consequentemente, é a própria Arte que nos ensina a realmente contemplar o mundo a nossa volta. “Não se vê uma coisa se não quando se compreende sua beleza” (Ibid., p. 56). A Arte é que nos mostra os encantos e efeitos da natureza, é ela que lhes dá, proporciona harmonia através de seu caráter sensorial.

Os personagens de Oscar Wilde neste diálogo recusam o realismo como aspecto artístico, pois este é pautado na descrição de fatos científicos e/ou materiais, sendo que a Arte, por sua vez, é uma produção cujo ponto de partida é justamente a imaginação, sendo que este elemento por si, dispensa o caráter da busca por verdades.

Ela se apresenta diretamente para a percepção, e esta não necessita da reflexão, da conceitualização e da racionalidade.

Por isso a mentira pode compor positivamente a obra de arte, visto que esta não possui compromisso com a verdade, e, portanto, não deve ser imitativa, e sim traçada pelo uso da imaginação: “A Arte começa com a decoração abstrata, com um trabalho puramente imaginativo e agradável, não se aplicando senão ao irreal, ao inexistente”. (Ibid., p. 39).

Agradecimento:

Agradecimento especial à CMG WORLDWIDE por autorizarem o uso das imagens de Oscar Wilde que ilustram esse artigo.

Referências:

  1. WILDE, Oscar. A Decadência da Mentira e Outros Ensaios. Rio de Janeiro: Imago, 1992. 199 p. (Coleção Lazuli). Tradução e Apresentação de João do Rio.

JULIANA VANNUCCHI
Sorocaba – São Paulo
Instagram | Website Fanzine Brasil

Deixe um comentário